Efeito Wolfgang Amadeus Mozart” nas galinhas: o que a ciência mostra

O chamado Efeito Mozart surgiu para humanos — estudiosos notaram que ouvir peças de Mozart parecia momentaneamente elevar o desempenho em tarefas de raciocínio espacial.

CIÊNCIA DA MATA

Jorge da Mata

5/8/20244 min read

brown chicken on green grass field during daytime
brown chicken on green grass field during daytime

Panorama da pesquisa: música, ruído e aves

Alguns estudos relevantes:

  • Um trabalho com pintos de 1 dia-velha dividiu os bichinhos em grupos expostos a: silêncio (controle); música de cordas de Mozart em nível 65–75 dB; ruído de ventiladores/maquinário 65–75 dB; ruído 85–95 dB; música de Mozart 85–95 dB. O resultado: música moderada (65–75 dB) reduziu os níveis de corticosterona (hormônio de estresse), enquanto níveis altos (85–95 dB), seja de música ou ruído, prejudicaram aprendizagem, aumentaram medo.

  • Outro estudo com poedeiras de várias raças avaliou ruído de 90 dB vs 65 dB e também música específica em nível 75 dB vs 65 dB. Neste caso, o ruído intenso elevou o índice heterófilo/linfócito (marcador de estresse) e aumentou o tempo de “imobilidade tônica” (medida de medo). Curiosamente, a música em nível moderado teve efeito negativo sobre o medo (duração maior da imobilidade) — ou seja, não “curou” o estresse neste experimento. ResearchGate

  • Um levantamento mais amplo sugere que estímulos sonoros (música ou ruído) podem funcionar como “enriquecimento ambiental” em aves — podendo diminuir comportamentos anormais (como bicagem de penas), melhorar bem-estar — desde que a intensidade, estilo e frequência do som sejam adequados. PMC

E o “efeito Mozart” propriamente dito em galinhas?

Não há (até onde achamos) um grande número de estudos focados exatamente em galinhas ouvindo Mozart e com aumento magnífico de produção. Mas os dados apontam para algumas tendências:

  • Se a música for moderada em volume, pode haver redução de estresse (corticosterona menor) em pintos. Exemplo: 65-75 dB de música de Mozart resultou em níveis mais baixos de CORT (corticosterona) em pintos. MDPI

  • Se o som for alto demais (85-95 dB), os resultados pioram: menos movimentação, mais medo, pior aprendizagem. PMC

  • Em poedeiras adultas, música clássica em 75 dB não reduziu o estresse e até aumentou a imobilidade tônica (mais medo) em comparação ao controle em um estudo espanhol.

  • Há relatos não-experimentais (agricultores) de que música clássica ou país/rock suave “acalmaram” aves, reduziram agressão, possivelmente aumentaram postura de ovos — mas são anedóticos e não replicados sistematicamente.

Interpretações e explicações possíveis

  • O “efeito” parece menos sobre Mozart por si só e mais sobre qualidade do som, nível de decibéis, ritmo, frequência, e contexto ambiental.

  • Um som moderado, com intervalos consonantes (agradáveis), pode reduzir o estresse e favorecer comportamento mais natural. Mas pode também, se mal aplicado (volume alto, ritmo agitado), aumentar o estresse.

  • O bem-estar da ave reflete estímulos auditivos: a música de qualidade pode funcionar como enriquecimento ambiental. Ruído alto e constante é estressor.

  • Para produção (por exemplo postura de ovos), os resultados ainda são mistos — não se pode afirmar “toque Mozart que aumenta 20% de ovos”.

  • Em termos de fisiologia: níveis menores de corticosterona sugerem menor estresse; índice heterófilo/linfócito maior indica estresse; comportamentos como preening (limpeza de penas), conforto, movimentação são indicadores de bem-estar.

Implicações práticas para quem planta galinhas (ou vive de criação)

  • Se você tem poedeiras ou pintos, considerar música ambiente suave, no volume moderado (por exemplo 65-75 dB), durante certos períodos pode ajudar o bem-estar e possivelmente a produção.

  • Evite ruído alto, máquinas barulhentas sem isolamento, música alta, som constante acima de 85 dB — isso pode prejudicar desempenho, aumentar estresse.

  • Escolha música com ritmo calmo, harmonias suaves — a “música clássica” ou country/folk leve parecem melhores do que rock pesado ou eletrônico.

  • Faça teste: monitore postura de ovos, comportamento (bicagem, agressão), níveis de alimentação e bem-estar. Compare ambientes “música” vs “silêncio/controle”.

  • Importante: cada criação, raça, idade das aves, densidade, iluminação e ambiente podem alterar resultados — não espere mesmo ganho espetacular sem cuidar de todo o manejo.

Limitações & lacunas

  • Poucos estudos replicaram resultados fortes em produção de ovos ou ganho de peso usando som música de Mozart em galinhas.

  • A maioria dos estudos concentra-se em comportamento, bem-estar, indicadores fisiológicos (hormônios), não tanto em produção comercial.

  • A idade das aves, raça, fase de crescimento, densidade, tipo de som, duração da exposição variam muito nos estudos — isso dificulta generalização.

  • O “efeito Mozart” nos humanos é controverso; portanto usar o rótulo “efeito Mozart nas galinhas” exige cautela.

Conclusão

Sim — existe evidência de que música moderada bem aplicada pode ter impacto positivo no comportamento e no bem-estar de galinhas. Mas não há confirmação de que “ouvir Mozart” vai automaticamente gerar-se um salto na produtividade. O importante é: qualidade do som, nível adequado, ambiente completo bem manejado. Para quem planta, vale testar, monitorar, ajustar — sempre como parte de um sistema de manejo mais amplo.

Jorge Da Mata
Editor

Fontes principais

  • Zhang S. et al., “Effects of Different Auditory Environments on Behavior, Learning Ability and Fearfulness of Laying Hen Chicks”, Animals, 2023. MDPI

  • Campo J.L., Gil M.G., Dávila S.G., “Effects of specific noise and music stimuli on stress and fear levels of laying hens of several breeds”, Applied Animal Behaviour Science, 2005. ResearchGate

  • “Effects of environmental sound stimulus on behavioral responses …”, PMC, 2011. PMC

  • “Effect of Music on Poultry – university/industry review”.